Correlação e Causalidade

A falácia de confundir correlação com causalidade ocorre quando se conclui que, porque dois eventos ou variáveis estão associados (isto é, apresentam uma correlação), um necessariamente causa o outro.

Erro central: Assumir uma relação de causa e efeito onde pode haver apenas coincidência, uma causa comum, ou até uma relação invertida.

Origem e contexto histórico

Embora a distinção entre correlação e causalidade seja antiga, sua formalização como falácia lógica e estatística ganhou destaque com o desenvolvimento da estatística inferencial no século XIX e XX.

Principais nomes:

  • Francis Galton: popularizou o conceito de correlação.

  • Karl Pearson: desenvolveu a fórmula do coeficiente de correlação.

  • Judea Pearl: um dos principais teóricos modernos da causalidade.

Áreas mais afetadas:

  • Jornalismo e mídia

  • Pesquisas em ciências sociais e saúde

  • Marketing e economia

  • Debates políticos

Como funciona na prática

A falácia ocorre porque, ao observar dois eventos que ocorrem juntos repetidamente, o cérebro tende a inferir uma relação de causa e efeito — uma estratégia evolutiva útil, mas logicamente arriscada.

Exemplos comuns:

  • “Pessoas que comem mais sorvete sofrem mais afogamentos.”
    (Na verdade, o calor do verão aumenta o consumo de sorvete e a frequência de banhos em rios e praias.)

  • “Crianças que têm livros em casa têm melhor desempenho escolar.”
    (Pode haver uma variável oculta como o nível educacional dos pais.)

A falácia persiste porque as correlações são visualmente e estatisticamente fáceis de identificar — já a causalidade exige experimentação e controle de variáveis.

Distorções cognitivas

  • Viés de confirmação: buscamos explicações que validem crenças prévias.

  • Ilusão de controle: tendência a superestimar nossa capacidade de entender e prever causas.

  • Heurística da disponibilidade: julgamos com base em exemplos vívidos e acessíveis.

  • Viés da intencionalidade: tendência a ver intenções e relações causais mesmo em processos aleatórios.

Esses vieses tornam as correlações atrativas e intuitivas — levando a inferências precipitadas e decisões mal fundamentadas.

Perguntas que podem ser feitas

  • Existe uma terceira variável que pode estar influenciando os dois fenômenos?

  • A ordem temporal entre os eventos faz sentido para sugerir causalidade?

  • A relação é consistente em diferentes contextos e populações?

  • Há evidência experimental ou apenas observacional?

  • A explicação causal é plausível biologicamente, psicologicamente ou fisicamente?

Histórias para se inspirar

A decisão do prefeito

Um prefeito observa que, após a instalação de antenas de celular, os casos de câncer aumentaram. Em coletiva de imprensa, afirma: “As antenas estão causando câncer.” A população protesta, exigindo sua remoção. Mais tarde, um estudo revela que o aumento dos diagnósticos se deve à inauguração recente de um centro de diagnóstico na mesma região – causa não relacionada, mas confundida pela correlação.

O investidor iniciante

Carlos vê que o preço do bitcoin sobe sempre que Elon Musk posta sobre tecnologia. Decide investir toda sua poupança. Nas semanas seguintes, Elon posta, mas o preço despenca. Carlos percebe tarde demais: havia uma correlação esporádica, não uma relação causal. A falácia custou caro.

A escola alternativa

Uma escola anuncia: “Nossos alunos têm notas acima da média e todos praticam meditação.” Pais correm para matricular os filhos, acreditando que a meditação causa boas notas. Investigações posteriores revelam que a escola seleciona alunos com alto desempenho acadêmico prévio. A correlação é real, mas a causa está invertida.

Fundamentação científica

Um dos estudos mais influentes sobre a confusão entre correlação e causalidade é Correlation is not causation: Statistics and the search for truth, publicado por David A. Freedman em 1999. Nesse trabalho, Freedman argumenta que muitos estudos observacionais interpretam de forma equivocada associações estatísticas como se fossem relações causais, o que pode levar a políticas públicas mal fundamentadas e decisões científicas problemáticas.

Ele destaca que, embora a correlação possa sugerir hipóteses, apenas estudos com experimentação controlada e fundamentos teóricos sólidos podem estabelecer causalidade de forma confiável. O autor também enfatiza a importância de distinguir entre associação estatística e relações de causa e efeito, sobretudo em contextos complexos como epidemiologia, ciências sociais e economia. Essa distinção é essencial para evitar erros de interpretação e promover decisões baseadas em evidências robustas e bem contextualizadas.

Reflita a respeito...

A falácia de confundir correlação com causalidade revela o quanto a busca por explicações simples pode nos desviar da verdade. Em tempos de excesso de dados, gráficos e estudos “científicos”, desenvolver um olhar crítico sobre como e por que os eventos se relacionam é essencial.

Evite cair nessa armadilha:

  • Questione o que está por trás dos números.

  • Exija controles, testes, fundamentos causais.

  • Desconfie de afirmações que soam certeiras demais sem evidência robusta.

Lembre-se: ver juntos não significa nascer juntos. Nem tudo o que ocorre ao mesmo tempo é causa ou consequência. A verdadeira compreensão requer mais do que observar, exige pensar com rigor.

Artigos

Descubra como pensar melhor:

O Que a Neurociência Revela Sobre Vieses Cognitivos e a Tomada de Decisão

Nossa mente processa milhares de decisões todos os dias, muitas vezes sem que percebamos. Mas até que ponto nossas escolhas...

As Armadilhas da Mente: Quando Falácias e Vieses Sabotam Nossas Decisões

Nossas decisões são moldadas pelo modo como interpretamos o mundo. No entanto, essa interpretação é frequentemente distorcida por vieses cognitivos...

Outras falácias

Conheça também outras falácias lógicas:

Falsa Causa

Petição de Princípio

Espantalho

Deixe seu comentário

Inscrever-se
Notificar de
guest
0 Comentários
mais antigos
mais recentes Mais votado
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários
0
Adoraria saber sua opinião, comente.x

GPT Feedback Cognitivo

Faça o seu cadastro a seguir para ter acesso exclusivo ao GPT Feedback Cognitivo:

Obs.: É necessário ter uma assinatura paga do ChatGPT para que você possa acessar este GPT.

GPT Mapa Metacognitivo

Faça o seu cadastro a seguir para ter acesso exclusivo ao GPT Metacognitivo:

Obs.: É necessário ter uma assinatura paga do ChatGPT para que você possa acessar este GPT.